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30/07/2015


79. 

A LEI DO TRABALHO

 

 


 


Os caminhos da evolução no nível humano são ciência e trabalho







Para preparar o reino do espírito é indispensável, antes, transformar a Terra, para que as construções superiores tenham suas bases em continuidade. 

É necessário, antes de pensar no progresso futuro, amadurecer o progresso presente. Maravilhoso é vosso dinamismo trabalhador e criador, não o tomeis, todavia, como meta absoluta, como tipo definitivo e completo de vida, mas apenas como meio para atingir um estado mais distante e algo superior. 

Aprendei a ver seus pontos fracos e a querer superá-los, porque neles também estão as culpas, os males e as dores que vos afligem. 

Admirai e, acima de tudo, aperfeiçoai; mas não tomeis a sério demais vossa civilização mecânica, que vos prepara um amanhã bem triste se não ”completar-se” pelos caminhos do espírito. 

Não é inútil, mesmo praticamente, conhecer o universo, sua lei, a linha do destino, as forças do bem e do mal que nele agem, corrigi-las, dominar a dor e as provas para a própria felicidade numa vida sem limites. Aceitai o trabalho e a ciência, mas colocai-os no nível que lhes compete:

o de apenas arar o campo em que deverá florescer um jardim. 





Mesmo o tipo médio terá de esperar sua ascensão e preparar-se para as super-construções sutis do espírito. Vosso dinamismo violento exprime vosso tipo dominante, vosso trabalho de criação nos níveis mais baixos da vida humana é apenas a base do grande edifício, cujo vértice se perde no céu.
 
Se o trabalho, tal como o entendeis, transforma a terra, não modifica, porém, o homem. O homem é o valor máximo, o centro dinâmico que sempre retorna. É a fase de consciência alcançada, a matriz de todas as construções futuras. 

Não basta criar o ambiente, indispensável agir também no âmago e criar o homem. Vossa atividade humana ilumina-se, então, com luz interior; valoriza-se com significado imensamente mais alto. 

Vossa mentalidade utilitária fez do trabalho uma condenação, transformastes o dom divino de plasmar o mundo à vossa imagem num tormento insaciável de posse. A lei “do ut des” (Dou para que tu dês), que impera no mundo econômico, fez do trabalho uma forma de luta e uma tentativa de furto. 




É uma dor que pesa sobre vós, mas isso é justo e cabível, porque exprime exatamente o que sois e o que mereceis. Todos os vossos males são devidos à vossa imperfeição social e à vossa impotência de saber fazer melhor.
 
Por isso, tantos males, como a guerra, são ocasionados pelo que sois e pelo que eles são, inevitáveis, até que vos transformeis. O trabalho não é uma necessidade econômica, mas uma necessidade moral. 

Ao conceito de trabalho econômico tem que substituir-se o de trabalho função-social. Direi mais: 

função biológica construtora. 



Tem a função de criar novos órgãos exteriores (a máquina), expressão do psiquismo; a função de fixar, com a repetição constante, os automatismos (sempre escola construtora de aptidões); a tarefa de coordenar o indivíduo no funcionamento orgânico da sociedade. 

Ao conceito limitadíssimo, egoísta e socialmente danoso, de trabalho-lucro, é preciso substituir o conceito de trabalho-dever e de trabalho-missão. Isto é um encaminhamento ao altruísmo, não um altruísmo sentimental e desordenado mas prático e ponderado, cujas vantagens são calculadas. 

Dado o tipo humano dominante, o altruísmo só pode nascer como utilidade coletiva. Utilidade que, pela lei do menor esforço, coloca-o, inexoravelmente, na linha da evolução. 

Limitar o trabalho, mesmo material, com a única finalidade egoísta do lucro, é diminuir-se, abdicando da consciência do próprio valor de que o trabalho é prova e confirmação; é um mutilar-se, uma renúncia à função de célula social, de construtor, que por menor que seja, tem seu lugar no funcionamento orgânico do universo.
 
Concebei o trabalho como instrumento de construção eterna, mas cujo fruto vos pertence, em forma de capacidade conquistada para a eternidade e não como lucro de vantagens imediatas e caducas. 

A verdadeira recompensa está em vosso valor, que o trabalho cria e mantém; não vos pode ser roubado. Amai o trabalho como disciplina do espírito, como escola de ascensões, como absoluta necessidade da vida, correspondente aos imperativos supremos da Lei, que impõe vosso progresso mediante vosso esforço. 

Ele dará um sentido de seriedade, de dever, de responsabilidade perante a vida, fazendo dela um campo de exercícios, ao invés de um carnaval de gozadores; evitará o espetáculo de tantas leviandades que insultam o pobre; dará alto valor ao dinheiro que deve ter sabor de esforço e que é o único honesto.
 
Assim, o trabalho não é uma condenação social dos deserdados, mas um dever de todos, a que não é lícito fugir.
 
Na minha ética é imoral quem se subtrai à própria função social de colaborar no organismo coletivo, em que cada um tem de estar em seu posto de combate. 

O ócio não é lícito, mesmo se permitido pelas condições econômicas. Esta é a moral mais baixa “do ut des”. Moral selvagem que tendes de ultrapassar. 




Assim, não é apenas por dever social, mas também por si mesmo; para não morrer, pois, o espírito deve nutrir-se cada dia de atividades; cada dia reconstruir-se, realizando-se no mundo da ação. 

Parar além do repouso indispensável é culpa de lesa-evolução. Quem vadia rouba à sociedade e a si mesmo. O novo mandamento é:

trabalhar.
Estas são as bases do mundo econômico do futuro, em que urge introduzir os conceitos morais de função e de coordenação de atividades. Em nenhum campo se pode ser agnóstico, amoral, espiritualmente ausente, numa sociedade consciente, orgânica e decidida a progredir. 

Só assim se eliminará tanto atrito inútil, de classes; tantos antagonismos de indivíduos e de povos. É necessário formar esta nova consciência de trabalho, porque só então ele se elevará à função social, à coordenação solidária (colaboracionismo) de forças sociais. 

Os conceitos do velho mundo econômico são absolutamente insuficientes. Temos que purificar a propriedade, tornando-a filha do trabalho. É necessário consolidar e não demolir essa instituição, reforçando-a nas bases, no momento da formação, que deve corresponder de modo absoluto a um princípio de equidade.
 
Em minha ética, rouba aquele que, por vias transversas, pouco importa se legais, acumula rapidamente, enriquecendo de um golpe; rouba quem vive de bens hereditários, no ócio; rouba quem não dá à sociedade todo o rendimento de sua capacidade. 

Para evitar esses males, temos que cortar o mal pela raiz, que está na alma humana. Este o primeiro passo a dar no campo das ascensões humanas: 

fazer um homem que saiba quem é, qual é seu dever, qual sua meta na Terra e na eternidade; 

um homem que se mova não no círculo estreito de um separatismo egoísta, mas num mundo de colaborações sociais e universais; um homem mais evoluído, que saiba acrescentar às suas aspirações materiais, as mais poderosas, de caráter espiritual; que faça do trabalho não uma condenação, mas um ato de valor e de conquista. 




Se ao retrocedermos no passado, o trabalho era posição de vencido e de escravo, ao contrário, ao progredirmos no futuro, mais o trabalho se tornará ato nobre de domínio e de elevação.
 
Eis o que vos aguarda no futuro. O progresso científico e mecânico iniciou novo ciclo de civilização. As forças naturais serão dominadas e submetidas, e o homem, tornando-se verdadeiramente rei do planeta, aí assumirá a direção das forças da matéria e da vida. 

As civilizações futuras vos imporão um regime de coordenação e de consciência, na qual se valorizará grandemente o tão depreciado valor moral e psíquico, fator fundamental para um ser que, em plena responsabilidade e conhecimento das consequências, terá que assumir a função de central psíquica, em torno da qual girarão, não mais o presente estado de luta e de anarquia, mas todas as forças do planeta, em perfeito funcionamento orgânico.
 
A luta presente é viva, porque é ativo o esforço que tende à construção das novas harmonias. A ciência se espiritualizará. Exaurida sua função utilitária, ultrapassará aquele seu caráter, adquirindo valor moral e metas espirituais.
 
A sutilização dos meios de pesquisa levar-vos-á, inevitavelmente, ao contato com essa mais profunda realidade do imponderável. A ética será um fato demonstrável, portanto, obrigatório para qualquer ser racional. Não será mais lícita a inconsciência do egoísmo, do vício, do mal, que tantas dores semeia em vossa vida. 

A evolução vos aperta e constrange fatalmente de todos os lados; vosso irrequieto dinamismo já trabalha vivamente para isso. A beleza do futuro será, sobretudo, o funcionamento harmônico de vosso mundo; vosso progresso será uma conquista de ordem, que vos harmonizará com a ordem reinante no universo. 



A matéria que completou seu ciclo de vida, atingiu o estado de ordem no universo astronômico; também o espírito, que hoje está para vós no período das primeiras formações caóticas, realizará a fase de ordem tanto mais quanto mais avançar no ciclo da vida.
 
Esperam-vos: ascensão e dilatação do concebível, transformações de consciência para dimensões superiores e contatos com os mais inexplorados ângulos do universo e campos de conhecimento. Deus se aproximará de vós, em vossa concepção, e o sentireis cada vez mais presente, cósmico, surpreendente. 

Vós, fundidos em Sua ordem, sereis muito mais felizes que hoje. Esse será o prêmio de vosso esforço.


28/07/2015


78. 

OS CAMINHOS DA 

EVOLUÇÃO HUMANA

 







Os caminhos da evolução humana podem ser considerados nos diversos planos, tanto de um ponto de vista individual como coletivo.

 











Se o princípio central da Lei é evolução, tanto que evoluir é sinônimo de ser, e só é possível existir como movimento de progresso (superior a qualquer regresso), evolução deve ser o conceito basilar da tábua de valores éticos.

Os conceitos de bem e de mal, de virtude e de vício, de dever e de culpa, embora relativos e progressivos (aliás, justamente por isso) só podem ser concebidos em função da evolução. 

Vimos esse fenômeno funcionar e triunfar em todas as dimensões que conheceis. Se a vossa fase atual é construção e ascensão de consciência, é desmaterialização de formas, é superação biológica e espiritualização de personalidade, esses conceitos resumem, com referência às posições relativas de cada um, o bem, a virtude, o dever. 

Os conceitos opostos significam posições também opostas: mal, vício, culpa, que são involução e descida.

 



Nesse regime de equilíbrio que governa o universo, mesmo no campo das forças morais, forma-se constantemente a soma dos impulsos e contra-impulsos, do dar e do haver. 

Por isso, a dor existe como fato substancial e insuprimível na ordem universal, pois tem exatamente a função necessária de estabilizador de equilíbrios, que são constantemente reconstituídos, logo que violados pela liberdade do ser. Daí o conceito de redenção por meio da dor. 

Por isso vos disse que ela é sempre um bem, enquanto retifica a trajetória dos destinos. Mal transitório, necessário em vista da necessidade da liberdade individual (base da responsabilidade e do merecimento). 

Sutiliza sempre o dar, acumula o crédito e transforma-se num meio de bem. Conceito evidente, já que o princípio de equilíbrio é universal e infalivelmente invade também o campo ético.
 
Colocadas essas bases racionais, é fácil a construção do edifício ético, que coincide com o posto em prática há milênios pelas religiões, filosofias, leis sociais, ditado pelas revelações, sentido pela intuição, mas sem esse fundamento de racionalidade que hoje é necessário para ser aceito pela psicologia moderna. 

Um cortejo de mártires e de escolhidos o compreenderam e puseram em prática de um lado ao outro do mundo, com sistemas diferentes, de acordo com a própria posição, mas sempre idênticos na aspiração constante para o alto. 

Os místicos, embora não se exprimissem de maneira científica, conheciam as leis da evolução das dimensões na fase $ \alpha $; realizavam num regime de constante educação a transformação biológica do homem em super-homem e pregavam o desapego da matéria, sua desmaterialização progressiva, com a renúncia e a superação da animalidade. 

Verdadeira técnica construtiva do psiquismo, assimilação por transmissão ao subconsciente de qualidades novas, estabilização da virtude no estado definitivo de instinto e, portanto, de
necessidade.
 
O demônio, eterno inimigo, personifica as forças negativas e involuídas da animalidade, que sobrevive e ressurge das mais baixas camadas da personalidade. Os instintos inferiores, as paixões tempestuosas, são o antagonista na grande luta interior. 



As grandes renúncias — pobreza, castidade, obediência — são os truncamentos decisivos de onde a animalidade sai amortecida; mas, recordemo-lo, só poderão valer quando se saiba concomitantemente reconstruir, compensando com qualidades mais elevadas, com amores, domínios e paixões mais espirituais, a fim de não desencaminhar o ser para outros lados, no vazio de uma asfixia infrutífera. 

Se impuserdes ao ser uma morte no nível animal, tendes de oferecer-lhe um renascimento no nível espiritual. As paixões são grandes forças que não devem ser destruídas, mas utilizadas e elevadas, já que na evolução tudo caminha por continuidade. 

Mas não deveis impor a virtude ao próximo, como meio de opressão, colocando-o em estado de renúncia, para com isso obter vosso domínio e vantagem na luta pela vida; que o esforço da virtude seja, acima de tudo, daquele que prega, como também daí venha sua vantagem.
 

... não deveis impor a virtude ao próximo, ...



Minha concepção implica uma ética progressiva, por isso vos mostra como modelo os tipos super-humanos cada vez mais perfeitos. Concepção aristocrática e dinâmica, antípoda da vossa, eleva ao tipo ideal a mediocridade da maioria.
 
A psicologia comum só pode dar a codificação dos instintos atrasados da humanidade. Elevar como modelo o medíocre, só porque se impõe pela quantidade e não pelo valor, significa erguer um monumento à inferioridade. 

O individualismo, porém, que emerge do quadro de fundo difuso da maioria, é sagrado, desde que lute sempre para elevar-se, pois esta é a lei da vida e a ascensão coletiva só pode ser resultante de todas as ascensões individuais. emergir do mar da mediocridade para as vias do bem. 

Que as massas sejam enquadradas para que os poderes dirigentes possam impor melhor o trabalho da evolução, mas não sejam elevadas como modelo e o número não sufoque o valor. Lá de cima, alta e longínqua, está a luz dos espíritos gigantes, que superaram e escravizaram ao espírito as forças biológicas. 

Deles estão cheios os séculos, e cada um aí encontrará o tipo que representa o aperfeiçoamento das próprias qualidades. O sensitivo encontrará no poeta e no santo o gênio da arte e da fé; o volitivo encontrará o gênio da racionalidade e da intuição no herói, no pensador e no cientista. 

Cada tipo ergueu bem alto o facho da vontade, da mente, ou do coração, tendo aperfeiçoado uma qualidade da natureza humana. Cada tipo é um pioneiro que vos mostra o caminho da evolução.
 
O tipo humano comum move-se em outros níveis. O mais baixo vive e só concebe viver no nível vegetativo; move-se num campo físico, no qual a ideação é concreta, quase muscular. 

O mundo sensório é toda a realidade, nenhuma abstração, nenhum conceito sintético o supera: os instintos primordiais (fome e amor) dominam a sua satisfação, são a única necessidade, alegria e aspiração. 

Psiquismo rudimentar, que só se exercita no campo passional de atrações e repulsões violentas e primitivas. Qualquer superação permanece no inconcebível; trevas dominam quase toda a consciência. É o selvagem e, nos países civilizados, o homem das classes inferiores, onde ele renasce por seu peso específico.
 
Mas a civilização criou um tipo mais elevado, com o psiquismo mais desperto, que chega até à racionalidade. A explosão das paixões é controlada, pelo menos nas aparências. Os instintos primordiais, ainda que sendo os mesmos, complicam-se, revestem-se de um trabalho reflexivo controlado; sutilizam-se, tornam-se mais nervosos e psíquicos.
 
Adora-se a riqueza e até a cultura; impera a ambição que incentiva a luta, que se torna cada vez mais nervosa e astuta, ultrapassa-se as metas do indispensável. 





Embora sensória, a realidade se enriquece. A zona do concebível dilata-se um pouco, mas fica sempre por fora dos fenômenos e é impotente diante de uma síntese substancial. 

Os princípios gerais são repetidos, mas não sentidos; há uma incapacidade de consciência quando vai além do interesse do “eu”, suprema exigência. O altruísmo não se expande além do círculo familiar. 

É o moderno homem civilizado, educado com verniz de informações culturais, volitivo, dinâmico, sem escrúpulos, egoísta, habituado a mentir, vazio de qualquer convicção e aspiração substancial. Sua impotência intuitiva e sintética denomina-se razão, objetividade, ciência, que são meios utilitários.
 
Existe um tipo ainda mais elevado de homem, dificilmente reconhecível por fora por quem ainda não tenha chegado a esse nível. Muitas vezes é um solitário, um mártir, cuja grandeza não é reconhecida senão depois da morte. Isso é natural. 

Só o medíocre pode ser logo compreendido e aclamado pela maioria dos iguais. Glória fácil e rápida significa pouco valor. Neste tipo, o concebível dilatou-se até a síntese máxima, a consciência atingiu a dimensão superior da intuição. 

Está muito distante da média, porque viu e compreendeu as altas metas da vida e só pode passar pela Terra em missão, amando e fazendo o bem. Com frequência está alheio e desprezado no mundo, mas seu gesto abraça toda a criação. 

Ele superou os instintos da animalidade, ou luta para superá-los. Não tem inimigos na Terra, a não ser as leis biológicas inferiores, que procura esmagar. Aceita a dor e considera sua a dor do mundo. Sabe e sente tudo o que, para seus semelhantes, se perde no inconcebível. 

Seus triunfos são muito amplos e distantes para serem vistos, porque ele se move no pensamento e na ação, aderindo à substância das coisas, em harmonia com o infinito. Este é o tipo da super-humanidade do futuro, em que a animalidade egoísta e feroz estará vencida e o espírito triunfará.
 
Essas gradações não são absolutas, nem como nível, nem como tipo; cada um oscila entre uma e outra. Mas a evolução é universal e constante, realizando a ascensão de um tipo ao outro. 

Ascensão do selvagem para a civilização, ascensão das classes inferiores para o bem-estar da burguesia; velha história das mais baixas ascensões humanas, impulso determinante das revoluções sociais. 

Mas hoje a persistência e a extensão da civilização amadureceram e difundiram o segundo tipo humano e, visto que é preciso evoluir, quando este for maioria, por ter elevado e assimilado o tipo inferior, sua revolução só poderá dirigir-se para o terceiro tipo: 

o super-homem. 





Embaixo agitam-se confusamente, as aspirações das classes sociais inferiores, prontas a submergir o egoísmo de raça para impor o interesse de classe, se a zona superior não souber defender sua função dirigente. 

O segundo tipo tende, por impulso evolutivo idêntico, a elevar-se ao nível do super-homem; esta é verdadeiramente a grande e nova transformação biológica, em massa, dos séculos futuros.
 
Minhas perspectivas futuras não são utopia, mas estão ligadas aos fatos e à evolução histórica normal. 

O fenômeno foi, no passado, um produto esporádico, isolado. No futuro tornar-se-á um produto de classe. A santa obra da educação do povo trará isto, em massa, ao nível médio e quando esta for a zona de maior extensão, nenhuma revolução poderá mais emergir de baixo. 

O progresso científico prepara inevitavelmente, apesar de seus perigos, um ambiente de menos áspera escravidão econômica e de mais intensa intelectualidade.





A civilização estabilizará rapidamente o nível médio da vida no segundo grau da evolução humana, que então desejará subir para o terceiro. Isto poderá parecer distante hoje, quando ainda ressoa o eco, entre vós, das lutas nos mais baixos níveis; mas o tempo está maduro, pela elaboração dos milênios, este é o futuro do mundo. 

Não vos falo do presente que conheceis, mas do futuro, que vos aguarda; não vos exponho apenas as dificuldades desta hora, mas também os problemas e as construções para as quais é necessário preparar-vos.




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24/07/2015


77. 

DESTINO

 O DIREITO DE PUNIR






Outro fator complica o cálculo das responsabilidades: 

o determinismo das causas introduzidas no passado, com as próprias ações, na trajetória do próprio destino

impulsos assimilados, por livre e responsável escolha, no edifício cinético do próprio psiquismo. 




Essas causas são forças colocadas em movimento pelo próprio “eu” e uma vez lançadas, são autônomas, até exaurir-se. Vossos atos prosseguem em seus efeitos, irresistivelmente, por leis de causalidade. Seu impulso é medido pela potência que imprimistes a esses atos, proporcionais e da mesma natureza, benéfica ou maléfica, ao impulso que destes. 

Assim o bem ou o mal dirigido aos outros é feito sobretudo a si mesmo; é regido pelas reações da Lei e recai sobre o autor como uma chuva de alegrias ou de dores. O destino implica, pois, uma responsabilidade composta, que é resultante do passado e do presente.
 
Cada ato é sempre livre em sua origem, mas não depois, porque então já pertence ao determinismo da lei de causalidade, que lhe impõe as reações e as consequências. O destino, como efeito do passado, contém, pois, zonas de absoluto determinismo, mas a ele sobrepõe-se a cada momento a liberdade do presente, que vai chegando continuamente e tem o poder de introduzir sempre novos impulsos e, neste sentido, de “corrigir” os precedentes. 

O impulso do destino pode comparar-se à inércia de uma massa lançada, que tende a prosseguir na direção iniciada mas, no entanto, pode sofrer atrações e desvios colaterais; esse impulso pode ser corrigido. 

Determinismo e liberdade, dessa maneira, contrabalançam-se, e o caminho é a resultante dada pela inércia do passado e pela constante ação corretora do presente. Nesses equilíbrios íntimos de forças reside o cálculo das responsabilidades. O presente pode corrigir o passado, numa vida de redenção; pode somar-se a ele nas estradas do bem, tanto quanto nas do mal. 

Diante do determinismo da Lei, que impõe a cada causa seu efeito, está o poder do livre-arbítrio, de corrigir a trajetória dos efeitos com a introdução de novos impulsos. Destino não é fatalismo, não é cega “Ánánke” (necessidade, determinismo, inevitabilidade), é a base de criações ou destruições contínuas. O que a cada momento está em ação no destino é a resultante de todas essas forças.
 


Ánánke

Responsabilidade progressiva, função do conhecimento e liberdade progressiva, cálculo complexo de forças; evolução, ao mesmo tempo libertação do determinismo das causas (destino), como do determinismo da matéria, eis a realidade mais profunda do fenômeno. 

Uma ética racional tornada ciência exata, que não seja mera arma de defesa, deve levar em conta todos esses fatores complexos; deve saber pesar essas forças e calcular-lhes a resultante; deve saber avaliar as motivações; reconstruir na personalidade seu passado biológico e orientar-se na vasta rede de causas e efeitos, de impulsos e contra-impulsos, que constituem o destino e sua correção. 

Para cada indivíduo o ponto de partida é muito diferente e não há maior absurdo, num mundo de substanciais desigualdades, que uma lei humana a posteriori, externa, igual para todos. Esta poderá satisfazer a funções sociais defensivas, mas não pode chamar-se justiça. Somente esta pode, pelas sanções morais e penais, constituir a base do direito de punir.
 
Isto está estritamente vinculado ao cálculo das responsabilidades, sem o qual não pode ser estabelecido. Tendo-se estabilizado por meio da força, como todos os direitos — na origem mera reação e necessidade de defesa —, transforma-se, por evolução, da fase de vingança pessoal à fase de proteção coletiva. 

A normalização jurídica da força, como no mais amplo processo da evolução da força em direito, a legalização da defesa dirige-se à conservação de um grupo sempre mais extenso, à proporção que surgem unidades coletivas cada vez mais vastas, do indivíduo à família, à classe, à nação, à humanidade. 

Em sua evolução, o direito penal circunscreve cada vez mais, até a eliminação das zonas indefesas, tornando mais difícil escapar à sua sanção (extradição), até cobrir todo o planeta; ao mesmo tempo atinge e disciplina cada vez mais numerosas formas de atividades humanas. 

Paralelamente, quanto mais se estende o direito, mais diminui a ferocidade, torna-se mais racional e inteligente; quanto mais se torna proteção da ordem pública, menos se faz pela reivindicação da ofensa sofrida pelo particular; é sempre menos “força” e sempre mais “justiça”. 

À medida que o homem se afasta das necessidades da vida animal, manifesta-se contínua circunscrição do arbítrio na defesa, que se torna mais equilíbrio jurídico; a justiça fica menos incompleta; à proporção que o juiz evolui, torna-se digno de conquistar o direito de julgar.
 
Assim, o fenômeno não apenas se projeta da fase individual à fase social, não só tende a estabelecer mais profunda ordem, tornando-se mais substancial, mas se desenvolve sempre mais e contém o fator moral, harmonizando-se em sistema ético. 

O conceito originário de prejuízo, ressarcimento, ofensa, eleva-se à reconstrução de equilíbrios mais altos, enriquecidos dos novos valores que a evolução terá desenvolvido; a balança da justiça se fará muito mais precisa, até o cálculo das responsabilidades específicas, isto é, até as diferentíssimas responsabilidades individuais. 

A primitiva e grosseira justiça do direito de defender-se, evoluirá para justiça que dá o direito de julgar e de punir; cada vez mais a balança do direito substituirá a espada da vingança; cada vez mais pesará a responsabilidade moral do culpado e sempre menos a própria tutela egoística. Em sua evolução, o jus de punir penetrará sempre mais a substância das motivações. 

A ascensão moral e psíquica do legislador o autorizará a fazer uma sindicância moral sempre mais profunda, porque só um juiz mais sensível e perfeito poderá ousar, sem tornar tirania de pensamento, aproximar-se da justiça substancial que vem da mão de Deus. Esta é a meta das formas humanas. 

Quanto mais evolução elevar o legislador, tanto mais o submeterá a um ato de bondade e de compreensão para com o culpado. A função social da defesa se enriquecerá mais de funções preventivas e educativas, porque o dever dos dirigentes é ajudar o homem involuído a subir.
 
Assim as duas ferocidades, da culpa e do castigo, abrandam-se; aproximam-se os extremos, harmoniza-se seu choque. Melhor que investir contra uma alma que só sabe ser má, porque é involuída, é ajudá-la a evoluir, demolindo-se os focos de infecções morais onde nascem essas flores maléficas. 



Absurdo enfurecer-se contra os efeitos, se as causas forem deixadas intactas. Não se resolve o problema apenas com o egoísmo da autodefesa, com a repressão sem a prevenção. Justo, muitas vezes, é só o que protege a si mesmo; deve ampliar-se até proteger a todos. 

Na balança social há um tributo anual de expulsos, segundo uma lei expressa pelas estatísticas. É preciso compreender essa lei e cortá-la pela raiz. Há deserdados cujo crime é o de serem marcados no nascimento por uma tara hereditária. 

Outros são falidos na luta pela vida, com a mesma psicologia e valor moral dos vencedores. Indispensável saber ler e trabalhar na alma; saber fazer o cálculo das responsabilidades; ultrapassar a desastrosa psicologia materialista da antropologia criminal. 

Delinquência é fenômeno de involução. É necessário alimentar todos os fatores de evolução, demolir os opostos, se quiserdes que o decurso da doença melhore e a sociedade possa arriar o fardo. 

O trabalho deve ser de penetração de espírito, de educar, corrigir, ajudar e, sobretudo — pretende-se guiar e punir em nome de uma justiça divina — de recordar a máxima evangélica: 

“Quem esteja sem pecado, lance a primeira pedra”.



23/07/2015


76. 

CÁLCULO DE RESPONSABILIDADES


 


O homem é responsável. Não basta dizê-lo. Mister demonstrá-lo. É preciso vincular a lei de equilíbrio que impera no campo moral, coativa em suas reações, com a outra, também de equilíbrio, sempre presente em todos os fenômenos.
 



Não é suficiente estabelecer os princípios da ética no seio de um sistema abstrato e isolado, mas é indispensável sabê-los vincular com a ordem de todos os fenômenos de qualquer tipo, no âmago de um funcionamento orgânico, universal, único. 

Temos de saber descobrir, na eternidade, o inexorável aparecimento dos efeitos das ações humanas. Sem uma compreensão de toda a fenomenologia universal, sem a visão unitária de uma síntese global, é absurdo pretender a solução de qualquer problema isolado. Para poder equacionar o problema da responsabilidade, é preciso primeiro ter penetrado o princípio da evolução que, no campo humano, significa evolução espiritual. 

Filosofias e religiões o afirmaram; uma multidão de místicos o sentiu e viveu, mas como demonstração racional — se tirarmos deste princípio as bases que o sustentam e o distinguem de toda a evolução física, dinâmica e biológica — ficará incompreensível e discutível. 

Primeiro é mister ter compreendido o nexo que existe entre todos os fenômenos; ter afirmado a indestrutibilidade da substância, apesar do transformismo universal contínuo; ter demonstrado a gênese biológica do psiquismo, sua eternidade, a técnica de seu crescimento, a meta superbiológica da vida, o princípio de causalidade e a férrea lei de suas reações, a lógica do destino e de suas vicissitudes, o significado das provas e da dor. Indispensável ter compreendido o valor espiritual da vida, em estreita relação com vossa moderna visão científica do mundo, em perfeita união com a realidade fenomênica, sem espaços intermediários de coisas desconhecidas e de incompreensões. 



Era lógico que o espírito, antes de empreender seu impulso para as regiões superiores do futuro, se inclinasse para trás, a fim de reencontrar suas origens no passado, e fizesse justiça ao trabalho realizado para sua preparação, desde as menores criaturas irmãs. Só agora, que está completa nossa viagem através dos mundos inferiores da matéria e da energia, é compreensível este último mundo das ascensões espirituais do homem.
 
Os fenômenos da ascensão moral, em todos os níveis, que culminam no misticismo do santo (super-homem antecipado nos mais altos graus da evolução), podem reduzir-se em termos científicos — por tudo o que dissemos na teoria dos movimentos vorticosos — àquele fenômeno de assimilação cinética, que vimos ter sido a base da formação e do desenvolvimento do psiquismo. 

Para quem compreendeu a técnica da evolução psíquica, o fenômeno da ascensão espiritual é simples:  

está logicamente colocado como continuação da evolução das formas inferiores. 

Em termos científicos, aquele fenômeno significa introduzir nas íntimas trajetórias dos movimentos vorticosos, de que é constituído o psiquismo humano, na fase $ \alpha $, novos impulsos provenientes de fora (o mundo da vida e das provas), para que sejam fundidos no âmbito daquelas forças e modifiquem aquelas trajetórias. 



Trata-se de enxertar no metabolismo do espírito, sempre escancarado para fora (ambiente), os elementos da química sutil do psiquismo. Praticamente vós os conheceis e
os chamais pensamentos e obras de bem ou de mal. 

Escapa-vos hoje o cálculo dessa química imponderável, mas um dia penetrareis na constituição vorticosa do psiquismo; pesareis seus impulsos sutis e, tendo colocado em termos exatos o conhecimento das forças internas e externas, compreendereis que é possível o cálculo das forças constitutivas e modificadoras do edifício cinético da personalidade humana. 


Escapa-vos hoje o cálculo dessa química imponderável


É possível, uma vez definido seu tipo específico de individuação e sua história passada — que sua presente conformação continua e resume em sua forma — estabelecer a direção da evolução iniciada e fixar a natureza e o valor das forças a introduzir, para que essa evolução avance proveitosamente e desenvolvam-se as notas fundamentais dessa personalidade. 

Enquanto hoje esses fenômenos ocorrem por tentativas, isto significará assumir a direção dos fenômenos biológicos no campo mais decisivo: o da formação da personalidade.
 
Sendo indispensável evoluir, a essa formação de consciência é irresistível o trabalho da vida individual e coletiva, e que enorme economia de energias significará saber realizá-lo! 

Se a humanidade tende biologicamente, como vimos, a criar um tipo de super-homem, vosso trabalho presente é buscar essa meta. A vida contém e pode produzir valores eternos. Sua finalidade é enriquecer-se deles cada vez mais. 

A vida tem um objetivo e vós, depois de haverdes aprendido a produzir e entesourar nas formas caducas da Terra, tereis de aprender agora para saber produzir e entesourar na substância, na eternidade. Para educar, é indispensável repetir, a fim de que certos conceitos mais elevados se assimilem e imprimam no íntimo turbilhão do psiquismo. 

Este é o objetivo da vida, esta é a função mais alta, pela qual se mede o valor daquela central dínamo-psíquica do organismo social, o Estado moderno.
 
Para o espírito ardente de fé, que sente por intuição essas verdades, é duro ter de falar assim, nos termos de uma moral científica exata, mas isto me é imposto por vosso nível, ainda não intuitivo, mas apenas racional. 

O cálculo da responsabilidade moral é possível, quando se conhece o fenômeno da evolução psíquica. Se este é dado pelo cálculo dos impulsos íntimos em relação aos ambientes e ainda às resultantes de suas combinações, esse é um cálculo de reações.

 


Tudo isto é apenas um momento da análise mais ampla, que pesquisa a linha das reencarnações e o desenvolvimento lógico do destino. 

Falo de desenvolvimento lógico porque, reconstruído o passado, vereis que ele, pelo princípio universal de causalidade, pesa, como uma força, no estado presente e no futuro, fazendo da personalidade uma massa com trajetória própria. Essa, por inércia, tende a manter-se constante, apesar de a vontade e a liberdade individual poderem lutar para modificá-la.
 
Na evolução, que é desmaterialização da substância em busca de formas psíquicas, a personalidade transforma seu “peso específico”, coloca-se, por natural lei de equilíbrio, em determinada altura, seu ambiente natural, ao qual sempre volta espontaneamente. Também este é um cálculo de forças que se tem de levar em conta no cálculo das responsabilidades. 

Quantas coisas teria de considerar o presumível direito social de punir se, apenas, ao invés de ser mera medida de defesa individual ou de classe, quisesse ser princípio de justiça! 

Aliás, prêmios e castigos substanciais não são os que os homens distribuem, exterioridades que não correspondem à substância, mas aqueles que, embora por meio deles, a Lei impõe, em sua sabedoria, acima das leis humanas, baseada em equilíbrios aos quais, compreendendo-os ou não, todos obedecem: 

juízes e réus, dirigentes e dependentes, por ação de um comando ao qual não é possível escapar.
 



Os homens vivem misturados, juntos, mas suas leis não se misturam; o que esmaga mortalmente um indivíduo, para outro pode ser incompreensível, porque nunca o experimentou. Todos são vizinhos e irmãos, no entanto, diante da concatenação das próprias obras e consequências, cada um está sozinho. 

Sozinho com sua responsabilidade e seu destino, tal como ele mesmo o quis. Os caminhos estão traçados e a ação humana exterior não os vê nem os modifica; os valores substanciais não correspondem às categorias e posições sociais. 

Além da justiça humana aparente, existe outra justiça diferente, divina, substancial, invisível e tremenda, à qual não se escapa na eternidade; esta não tem pressa, mas castiga inexoravelmente. No enredo dos destinos e dos objetivos de todos há uma linha individual, independente. 

Em qualquer ambiente se pode avançar ou retroceder na própria caminhada. Cada vida contém as provas necessárias e as melhores, mesmo que não sejam grandes nem espetaculares, mas sempre as mais adequadas e proporcionais.
 
Vimos como o ser, na evolução, ao subir da matéria ao espírito, passa também da lei da primeira, o determinismo, para a lei do segundo, a livre escolha. A ação é a resultante dos impulsos e da capacidade individual de reagir. 

A responsabilidade é relativa ao grau de evolução, porque age em função da maior ou menor extensão da zona de determinismo ou livre-arbítrio, que predomina na personalidade. 



Embora no mesmo ambiente, com os mesmos agentes psíquicos, o indivíduo reagirá de modo diferente. Sendo o ato o mesmo, o valor e o significado dele são muito diversos, de acordo com os vários tipos humanos e por isso muito diferente será a responsabilidade. 

Responsabilidade relativa, estritamente vinculada ao nível evolutivo, ou seja, conhecimento e liberdade, proporcionalmente aos quais nascem os deveres e se restringe o campo do que é lícito.
 
Falo de responsabilidade substancial, não da aparente que os homens se impõem mutuamente, por necessidade de defesa e conveniência. Falo de culpa, isto é, mal consciente, introdução de impulsos anti-evolutivos, que só excitam reação de dor. No campo humano, mal é involução, bem é ascensão, pois a grande lei é evolução. 





Culpa é a violação dessa lei de progresso, é rebelião ao impulso que leva a Deus, à ordem; é qualquer ato de anarquia. Dor é o efeito da reação da Lei violada, que se manifesta em sua vontade de reconstrução da ordem, que quer levar tudo a Deus; reação a que chamais punição. 

Quanto mais progredirdes, mais poderíeis cair, pela maior liberdade, se o estado mais adiantado de progresso não fosse protegido por um conhecimento proporcional.


16/07/2015



75. 

O HOMEM





Vimos a fase $ \alpha $ em seu aspecto conceitual, ao observarmos a evolução das leis da vida; em seu aspecto dinâmico, ao observarmos a gênese e a ascensão do psiquismo; em seu aspecto estático, ao observarmos as manifestações desse psiquismo nos órgãos internos e externos, em seu funcionamento, na direção da máquina orgânica.
 



Com isto, nossa longa caminhada de $ \gamma $ para $ \alpha $ está terminada. Chegamos ao homem, à sua alma.
 
Antes de deixar-vos, concentremos a atenção neste ponto culminante da evolução, nessa obra altíssima, preparada por tão longa caminhada e tão grande trabalho. 

Olhemos o homem como indivíduo e como coletividade, em suas leis, em seu progresso; olhemos o futuro que o espera no momento decisivo de sua mais elevada maturação biológica atual.
 
O homem, o Prometeu, de rosto luminoso, dominador no gesto, é, em seu organismo, todo ele, a expressão prepotente de um psiquismo interior. 

No olhar profundo, a potência de um rei que enfrenta o infinito; no punho fechado, o poder do vencedor da vida em seu planeta. No entanto, ele está pregado na rocha, suas vísceras dilaceradas pela águia; a seus pés, um mar de sangue. 



Aquele rosto é a única luz nas trevas profundas, cheias de sombras e de terrores, de dores e de delitos. Lívidos fulgores de exércitos, intermináveis fileiras de cruzes, enganadora cintilação de ouro, de vaidades, de prazeres e, sobretudo, um grito estridente de dor que clama por Deus.
 
Quanto esforço para reencontrar Deus! Grandeza de espírito, potência de vontade e de ação, agudeza de sabedoria, por toda parte um esforço titânico, jamais domado, de superar-se a si mesmo e vencer o mundo; a cada passo, um báratro tenebroso que engole tudo; uma potência escura de destruição que nivela tudo na morte e no esquecimento.
 
Na eterna fuga, sempre nova onda sobrevém e submerge o passado, apaga e recomeça a vida. 

A corrida prossegue sem repouso, à luz incerta das miragens ilusórias. Nesta atmosfera densa e escura, o homem luta e sangra, buscando sua luz.
Quanta dor! É um mar sem limites, donde emerge apenas o braço do homem, que agita um facho de luz: 

é o gênio. 





No fundo triste e lamacento, patinam os piores em seu elemento, a sorrir, felizes e inconscientes. O gênio — seja artista, místico, pensador, santo, herói ou caudilho — é sempre uma cabeça em antecipação sobre a evolução, que o rebanho ignaro acompanha, por lei da vida. Seu destino é titânico: um abismo por onde passam zonas de paixão e de laceração, tempestades e visões nas quais está a voz de Deus. 

O gênio alça-se, angustiando-se, do leito de sua dor e da dor do mundo; com gesto supremo e tremendo, fixa o infinito com firmeza; mergulha no coração do mistério e rasga-lhe o véu, para que a vida caminhe. A massa inerte da grande alma coletiva experimenta súbita dilatação e vê, acompanha e sobe.
 
Por vezes, no inferno terrestre cai uma estrela do céu, só para chorar e amar; chora e ama durante uma vida inteira, cantando na dor própria e alheia, um canto divino inebriado de amor. 

A dor vergasta e a alma canta. Aquele canto tem estranha magia: amansa a fera humana, faz florescer as rosas entre os espinhos e os lírios na lama; a fera retrai suas garras; a dor, o seu assalto; o destino, seu aperto; o homem, sua ofensa. 

A magia da bondade e a harmonia do amor vencem a todos; dilata-se e com ele canta e ressoa toda a criação. Naquele canto amargurado há tanta fé, tanta esperança, que a dor transforma-se em paixão de bem e de ascensão. 

Aquele canto humilde e bom chega de muito longe, cheio das coisas de Deus; é novo perfume em que vibra o infinito; é secreto ciciar de paixão que fala à alma e revela, pelas vias do coração, mais que qualquer ciência, o mistério do ser; é uma carícia em que a dor repousa. 

Tudo se encarniça na Terra contra o mais simples e inerme que fala de Deus, para fazê-lo calar. Mas a palavra doce ressurge sempre, expande-se, triunfa. Porque é lei que a Boa Nova do Cristo se realize, o mal seja vencido e venha o Reino de Deus. 

A dor golpeará sem piedade, mas a alma humana emergirá de suas provas e a vida iniciará novo ciclo, pois, o momento está maduro e é lei que a besta transforme-se em anjo, da desordem surja nova harmonia e o hino da vida seja cantado mais alto.
 
O materialismo fez do homem um ser mau, dedicado a oprimir o próprio semelhante, homo homini lupus (o homem é o lobo do homem). Dele, faremos um ser justo e bom, dedicado a beneficiar seus irmãos. 





A ciência o fez perverso, nós, por meio da própria ciência, fá-lo-emos melhor. O homem é o artífice de seu destino: tem que arrostar o esforço de criar a si mesmo; deve esculpir a grande obra do espírito, na tosca matéria da vida. 

Seu deve ser o esforço da superação biológica e da liberação da lei mais baixa do mundo animal, seu será o triunfo da ascensão espiritual no campo de todos os valores humanos. Cada prova, cada dor e cada vitória serão um golpe de cinzel que definirá e embelezará a obra divina ao sol.
 
As conclusões estão iminentes. As questões científicas estão superadas. Esses problemas, longe de vós, podiam deixar-vos indiferentes. As conclusões vos atingem de perto em vossa vida, em vossa felicidade, em vosso futuro individual e coletivo. Se sois racionais, não podereis mais agora recusá-las, em nome de vossa própria razão e de vossa própria ciência. Há quem compreenda porque sente. 

Meu esforço teria sido muito menor se tivesse de falar apenas a quem já sente e compreende. Este livro foi escrito para quem precisa de demonstração para compreender; para eles foi feito este esforço de racionalidade, que doutra forma não teria sido necessário.
 
Podereis ter lido por curiosidade, mas cada palavra foi dita, cada conceito colocado em seu lugar, para que agissem como impulso convergente para essas conclusões. Todos os conceitos são força que, como ondas, repassam por todo o infinito, dirigindo-se para esta passagem, de onde dito as normas de vida individual e social, que não podeis mais repelir. 

Não tratei convosco questões de fé, porque aprendestes a fugir da fé; levanto as questões de razão e de ciência, e com essas vossas mesmas armas, com que tentastes demolir Deus e o mundo do espírito, eu vos obriguei progressivamente, em constrição férrea, a voltardes a Deus e ao espírito.
 
Minha palavra, eu disse, é verdadeira: realizou-se e se realizará. A semente está lançada e brotará. Ao mundo, indico a via do espírito, a única via das ascensões humanas na arte, na literatura, na ciência. Abri-vos esta porta para o infinito, que a razão e a ciência haviam fechado. Por esta estrada de conquistas, guiarei os fortes que me quiserem seguir.
 
Disse-vos que estais numa grande encruzilhada da vida do mundo. A Lei, que amadureceu por dois milênios, impõe hoje esta revolução biológica. Os fatos, que sabem fazer-se ouvir, constranger-vos-ão. 

Trata-se de movimentos mundiais de massa e de espíritos, de povos e de conceitos, movimentos profundos de que ninguém escapará. Mas antes que falem os fatos e se desencadeiem as forças mais baixas da vida, tinha de falar o pensamento, tinha de ser dado o aviso para que, quem o pudesse, compreendesse.
 
Falais sempre de força, falei-vos apenas de equilíbrios e ordem. Mostrei-vos, para além da aparência das coisas, uma realidade muito mais profunda e verdadeira; além da injustiça humana, uma justiça substancial; em cada pensamento meu, vistes palpitar a presença de uma Lei suprema, que é Deus. 

É lei de bondade e de justiça, mas justamente porque é lei de justiça, é também lei de reação, que sabe explodir tempestuosamente no destino individual como no coletivo.
 
Ignorando esse equilíbrio, usurpais cada vez mais ao destino inexorável, excitando um furacão de reações. A cadeia transmite-se de geração em geração, o déficit acumula-se e vos submerge. 

Então, no fundo de um céu em tempestade, aparecem os profetas bíblicos, conclamando à penitência e então irrompem os cataclismos que são batismos de dor. 



A humanidade sai deles purificada, como se só pela dor conquistasse seus direitos; depois do reequilíbrio, reencontra a possibilidade de retomar o caminho interrompido da sua evolução.
 
Falei-vos de ideais e de princípios, com palavras de paz, que podem fazer sorrir o sapiente ceticismo moderno.
 
Em vosso mundo, ao invés de colocar no alto os princípios, por eles lutando, são colocados os interesses e sobre eles fabricam-se princípios fictícios. Existem os ideais e as crenças oficiais, mas no profundo da alma humana existe a mentira. 

Desprezais o vencido, mesmo se é um justo; estimais o vencedor, embora seja desonesto. Acreditais só na matéria; confiais apenas na riqueza e na força, mas estas vos trairão.
 
Deveis compreender que, num regime de ordem universal, como vos mostrei, num campo infinito de forças conexas e poderosíssimas, embora imponderáveis e ultra-sensórias, agir com baixeza e leviandade significa expor-se a reações tremendas. 

A história está cheia delas. A lei está presente e comanda sempre todos, dirigentes ou dependentes; cada um tem sua responsabilidade em seu posto de combate. 

Ao conceito superficial de uma negação fácil de qualquer disciplina moral — como o materialismo científico difundiu no último século — opõe-se hoje o conceito oposto: 

o homem é responsável. 

Ele não vive isolado, mas em sociedades que “devem” ser organismos, onde cada indivíduo tem um trabalho a realizar. A vida não é ócio, mas esforço de conquista. Acima de todos os interesses materiais, há um interesse ideal igualmente urgente e importante, que atinge todos. 



Todas as instituições sociais e jurídicas, o trabalho, a propriedade, a riqueza e a concepção do Estado e do seu funcionamento, não são conceitos isolados, mas são “funções” da Lei; isto é, enquadram-se logicamente e não podem compreender-se, senão quando enquadrados no funcionamento orgânico do universo.
 
Como esta síntese é uma filosofia da ciência, assim, aqui estão as bases, que até agora jamais foram colocadas, de uma filosofia científica do direito. No campo moral cai qualquer empirismo, porque cada ato, cada pensamento, cada motivação tem sua meta, seu peso e, por cálculo matemático de forças, marca o destino de quem o executa. Pela primeira vez na história do homem ouve-se falar numa ética científica, racional, exata. 

O mundo da ética não é mais um campo de fé ou de abstrações: é um cálculo exato de forças. Se estas muitas vezes não são percebidas, porque sutis demais à justiça humana, outro equilíbrio mais profundo, a justiça divina, registra-as em vosso destino, as pesa e vos impõe a resultante, em forma de alegria ou de dor. 

Sois livres: podeis sorrir e negar tudo isto. Mas se violardes uma só dessas consequências, violareis a ordem de todo o universo e ele se levantará contra vós para esmagar-vos. Esta minha voz é a voz da justiça e de vossa consciência, onde troveja a voz de Deus e não podeis fazê-la calar.
 
Dei-vos um conceito da vida que extravasa sem limites no tempo, na qual nada se perde, nenhuma dor é vã, onde cada átimo é construtivo e é possível acumular e possuir verdadeira riqueza que não se destrói. 

Ensino-vos a valorizar e utilizar a dor. Olhemos juntos o âmago das coisas, não inutilmente, porque dele extraímos otimismo consciente e triunfante até na adversidade. Só os inconscientes podem pedir o absurdo de uma felicidade fácil, não conquistada; eu vos falei de luta e esforço para que a vitória, medida de vosso valor, seja vossa. 

Realizamos juntos a longa e cansativa caminhada da ascensão do ser, para que conheçais vosso amanhã e vos prepareis para ele porque, através de uma cortina de provas decisivas em vosso amontoar-se desordenado de formações psíquicas, já resplandece a luminosidade do futuro, no fundo imenso da evolução trifásica de vosso universo.